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quarta-feira, 19 de junho de 2013

2400 - O passado condena



O BISCOITO MOLHADO
Edição 4200                               Data:  02  de Junho  de 2013


MENSAGENS ELETRÔNICAS ENVIADAS E COMENTADAS

Enviaram-me um e-mail, intitulado Ricardão, com um vídeo em que o dito cujo desce por uma “teresa” do segundo andar de um prédio em São Paulo, onde, na varanda, marido enganado de mulher infiel discute e o Corpo de Bombeiros espera para agir. Uma pequena multidão a tudo assiste com gritos e apupos.
A mocidade de hoje, em sua grande maioria, aponta alguém como Ricardão, mas não sabe que o nome surgiu de um programa humorístico, “Balança, mas não cai”, criado por Haroldo Barbosa e Max Nunes. Ricardão era o consolo do “Primo Pobre” pois, enquanto sua mulher, “Fomizelda”, era fiel, a do “Primo Rico” aprontava mil peripécias com o “Ricardão”, sob o nariz do marido ingênuo.
“Teresa” é um amarrado de lençóis, que substitui a corda na falta da mesma, é uma gíria criada nos presídios, o calão dos presos. O Ricardão do vídeo foi, provavelmente, trancado no quarto pelo marido traído e, por isso, o jeito que encontrou para sair dali foi amarrar os lençóis, que alguém dado a literatices diria, “ainda quentes do pecado” e descer por essa corda improvisada  até a rua. Desceu de cuecas, pois se vê o traído atirando as suas roupas pela varanda. Para tornar a cena ainda mais grotesca, o fugitivo vestia apenas uma cueca samba-canção, mas fosse zorbinha e a bufonaria da cena não seria menor.
Para Nélson Rodrigues, não bastaria o marido atirar as roupas do seu rival pela janela e gritar com a infiel, o desfecho teria de ser como nas óperas veristas italianas, com um ou dois corpos ensaguentados. A própria plateia, que também tinha atuação marcante, contribuía para o clima de pornochanchada ou de comédias do Lando Buzzanca.
-Corno. - gritaram.
-Tarado.
A mulher, pelo que vi e ouvi, foi poupada dos gritos da multidão.
Houve um coro de “Pula”, quando não havia mais metros de tereza para ele descer e puser o pé no chão. Escutam-se, então, gritinhos femininos do público, pois, se ele seguisse o sádico pedido, se arrebentaria no chão. Foi a vez, então, dos bombeiros agirem, pegaram a cama elástica, colocaram-na de modo que a queda do sujeito fosse aparada. 
A operação resgate alcançou pleno êxito. Houve aplausos, uns para os bombeiros, outros para o Ricardão. Este, já no meio da plateia, também foi apupado. Exibindo uma barriga de quem esvazia garrafas de cerveja, gesticulou pleno de razão contra o rival, que ainda discutia com a mulher, e contra aqueles que o vaiavam.
-Será que algum gaiato levou-lhe as calças? O vídeo não mostra isso, contudo o local da traição está por demais evidente. Os dois, mesmo que permaneçam juntos, devem estar, a esta hora, procurando novo apartamento.

Há alguns anos, recebi uma mensagem eletrônica em que aparece a TV Excelsior. Ela desapareceu no meio dos milhares de arquivos que estão no meu computador e nunca mais a encontrei. Eis que nessa semana, com o nome de “Presente do Passado”, Dieckmann me envia uma série de fotografias de tempos idos e lá estava o prédio da TV Excelsior.  Eu não podia perder essa oportunidade, tinha de mostrá-la ao meu irmão que, quando jovem, lá trabalhou. Como ele é avesso ao computador, eu teria de atraí-lo para frente de um, no caso, o do seu filho, Daniel.
Assim, no feriado de Corpus Christi, disse-lhe que tinha algo que ele não poderia deixar de ver, enviado por um amigo. Não foi apenas ele que ficou diante do monitor de vídeo, a Gina também. Quando acessei o “Presente do Passado” e as fotografias começaram a surgir, as reminiscências dos dois afloraram, a minha também.
-Eis o Lido I – indiquei.
-Lembra-se Claudio, quando namorávamos, que você achou um guarda-chuva quando as luzes do cinema se acenderam?
-A chuva lá fora fez a dona se lembrar, mas já era tarde, eu não queria me molhar.
-Você disse, na época, que não queria que eu me molhasse.
-Eu não recordo dessa parte. - afirmou.
-Este aqui é o Metro Copacabana.
-Fui muito a esse cinema com o Dudu, que morou desde pequeno na Rua Prado Júnior. - referiu-se ele ao nosso primo predileto, já falecido.
-O Filme em cartaz é “A Violentada”, que eu não assisti, mas você, sim.
-E prossegui:
-Mesmo não tendo assistido, lembrava-me da Margaux Hemingway.
-Outra neta do Hemingway também trabalha...
-Bem, Claudio, só aparecem os nomes no cartaz da Margaux, da Ann Bancroft e da Chris Sarandon.
Passei para outra foto.
-A Sears. - manifestou-se a Gina.
-Gostava de ir lá fazer compras, pena que o dinheiro na bolsa era pouco.
-Não sei se a Sears era shopping, mesmo que fosse, o primeiro do Brasil foi o Shopping do Méier. - falou mais alto o bairrismo do meu irmão.
-Agora, o Cine Paissandu.
-Nunca fui lá, eu não sofria de afetação intelectual.
-Nem eu. - corroborou a Gina as palavras do marido.
-O mais perto que cheguei do Paissandu foi em 1979, quando fiz um curso de Comércio Exterior no Instituto Bennett, e esperava o ônibus para ir ao Centro na frente do cinema. 
Enfim, chegamos ao prédio da TV Excelsior.
-Era, antes, o Cinema Astória. - observou meu irmão.
-Quantas vezes frequentei a TV Excelsior!... Vi Chacrinha, Os Trapalhões, Dercy Beaucoup, Eliana...
-Que Eliana era essa?- interrompi a Gina.
-A Eliana Pittman. - respondeu-me.
-Os Trapalhões começaram com Renato Aragão, Ted Boy Marino, Vanusa e...
-Ivon Curi. - refrescou-me o Claudio a memória.
-Papai não gostava desse programa porque você levava pés no peito do Ted Boy Marino.
-Ele só acertava um de nós e todos caíam como no dominó.
-Lembra-se do Isaque (irmão do nosso cunhado), que trabalhava na novela “A Ilha do Tesouro”, baseada no romance infanto-juvenil do Robert Louis Stevenson?
-O que tem?...
-Ele era um dos que cavavam a terra ,quando entrou o comercial Na hora em que a câmera voltou a mostrar a cena, estavam todos descansando, alguém deve ter acenado porque eles voltaram correndo para a  pá.
-Era tudo feito ao vivo. - disse a Gina.
E surgiu no monitor de vídeo a TV Globo.
-Ficava na General San Martin, muitos de nós da Excelsior, trabalhávamos na Globo. O humorístico “Bairro Feliz” era feito por atores da Excelsior.
-Até que houve o acordo com o grupo Time-Life e a TV Globo se tornou uma potência. - aparteei meu irmão.
-A ditadura militar ajudou a TV do Roberto Marinho, enquanto acabava com o Panair do Brasil e, consequentemente, com a TV Excelsior. - esbravejou indignado.
-Há uma foto de um avião da Panair do Brasil.
-Mario Wallace Simonsen não agradava os militares, por isso acabaram com tudo o que lhe pertencia.
Compreendi inteiramente a indignação do Cláudio e completei:
-Anos de chumbo, mas que não apagaram as boas lembranças.

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