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terça-feira, 31 de julho de 2012

2193 - o pulgueiro do quinta

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O BISCOITO MOLHADO
Edição 3993                                          Data: 23 de julho de 2012
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64ª VISITA À MINHA CASA
2ª PARTE

-Mario Quintana, “O Aprendiz de Feiticeiro” é o nome de um poema de Goethe. Você usou esse nome para intitular uma obra sua de poesia?
-Sim, foi o meu quinto livro.
-Você não traduziu nada de Goethe?
-Eu não dominava a língua alemã; traduzi autores que escreviam em inglês e francês.
-Nós lembramos Proust, mas um número razoável de livros de Balzac foram vertidos para o português por você.
Qual!... - fez um gesto de condescendência e acrescentou:
-Ele escreveu 88 livros, eu não traduzi 5% da sua obra completa.
Contei “Os sofrimentos do inventor”, “Uma paixão no deserto”, “Os Proscritos” e “Seráfita”. Dei-lhe razão e continuei:
-”O Aprendiz de Feiticeiro” foi publicado em 1950; no ano subsequente, ”Espelho Mágico”. Em 1953, você ingressou no “Correio do Povo”, e se responsabilizou por uma coluna diária até 1967. Era muito trabalho?
-Sim.
-Rubem Braga conta que, certa vez, sem ideia para cumprir o compromisso de entregar uma crônica no jornal, entregou a de um cronista mineiro, ainda desconhecido na Capital Federal, como se fosse sua. Esse cronista era o Carlos Drummond de Andrade.
-Drummond era uma excelente pessoa, não se aborreceu com ele, réu confesso.
-Manuel Bandeira escreveu, certa vez, que todos os cronistas guardavam os voos mais altos para o poema, o que não acontecia com Rubem Braga, por isso ele era o cronista maior.
-Há crônicas de Drummond de grande beleza poética. - frisou.
-As suas crônicas, embora eu confesse que não li muitas, não perderam a poesia.

segunda-feira, 30 de julho de 2012

2192 - o quarteto do quinta

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O BISCOITO MOLHADO
Edição 3992                                          Data: 22 de julho de 2012
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64ª VISITA À MINHA CASA

-Mario Quintana, costumo levantar a cabeça e vê-lo na tela do meu computador, agora, eu o vejo em carne e osso.
-Não exagere. - sorriu o poeta.
-É verdade; você está fisicamente morto desde 1994.
-A morte é a libertação total: a morte é quando a gente pode, afinal, estar deitado de sapatos.
-Pois é, Mario Quintana, seus pensamentos, tanto quanto sua poesia, povoam as telas dos computadores através de mensagens eletrônicas.
-Alegro-me em não ter sido esquecido.
-Não foi você mesmo que escreveu... Deixe-me ver no computador...
Ao ver-me atrapalhado com a minha memória, interveio com a gentileza que lhe era peculiar.
-Não há necessidade, eu repito.
E repetiu:
-”Amigos, não consultem os relógios quando um dia me for de vossas vidas... Porque o tempo é uma invenção da morte: não o conhece a vida – a verdadeira – em que basta um momento de poesia para nos dar a eternidade inteira.”
-Sim, a sua poesia o eternizou, mas também, insisto, os seus pensamentos. Muitas vezes, dos atos mais prosaicos você mostrava uma profundidade oculta, como nessas suas palavras...
Dessa vez, não titubeei em reproduzi-las de cor:
“Olho em redor do bar em que escrevo estas linhas. Aquele homem ali no balcão, caninha após caninha, nem desconfia que se acha conosco desde o início das eras. Pensa que está somente afogando problemas dele, João Silva... Ele está é bebendo a milenar inquietação do mundo.”
-É tudo poesia. - resumiu Mario Quintana.
-Você nasceu em Alegrete, Rio Grande do Sul, em 1906?
-Filho do farmacêutico Celso de Oliveira Quintana e Dona Virgínia de Miranda Quintana. A minha cartilha foi o jornal Correio do Povo, com ele meus pais me ensinaram a ler.
-E com “Le Figaro”, eles o ensinaram francês? - brinquei.
-É verdade que o início do meu aprendizado da língua francesa se deu com os meus pais.
-Lá, em Alegrete, você concluiu o curso primário?
-Sim, na escola do mestre português Antônio Cabral Beirão; e já trabalhava na farmácia da família.
-Com 13 anos de idade, em 1919, você foi matriculado no Colégio Militar de Porto Alegre, em regime de internato?
-Sim; existia, na época, a revista Hyloea, órgão da Sociedade Cívica e Literária dos alunos, em que publiquei os meus primeiros esboços literários. Em 1924, deixei o Colégio Militar e me empreguei na Editora Globo, conhecida pelos literatos de todo o Brasil.
-Quando você retornou para Alegrete?
-No ano seguinte, 1925, quando voltei a trabalhar na farmácia. Perdi a minha mãe, pouco depois. Publiquei um conto para um concurso do Diário de Notícias, de Porto Alegre, e me premiaram. Meu pai não durou muito depois do falecimento da minha mãe. Álvaro Moreira, diretor da revista “Para Todos”, do Rio de Janeiro, pediu-me um poema para publicar, e atendi ao seu pedido.
-E os acontecimentos políticos?... Pelo menos uma vez na vida, os gaúchos se envolvem com a política até a medula.
-Empolguei-me com a revolução liderada por Getúlio Vargas, em 1930, alistei-me como voluntário do Sétimo Batalhão de Caçadores de Porto Alegre e vim para o Rio de Janeiro. Em 1931, retornava ao Rio Grande do Sul e ao jornal “O Estado do Rio Grande”.
-Em 1935, você inicia o seu trabalho de tradutor de obras de Proust, Giovanni Papini, Voltaire, Virgínia Woolf, Guy de Maupassant, Balzac, Beaumarchais, Somerset Maugham. Não preciso dizer que a dificuldade maior se deu na versão de Proust do francês para a nossa língua,
-Uma frase de Proust subia, descia, dobrava a esquina e eu não sabia onde pararia. No quinto volume de “À Procura do Tempo Perdido” intitulado “A Prisioneira”, há uma frase que ocupa quase toda uma página.
-Quais os volumes da obra-prima de Proust que você traduziu?
-”No Caminho de Swann”, “À Sombra das Raparigas em Flor”, “O Caminho de Guermantes”, “Sodoma e Gomorra”.
-Você voltou a trabalhar na Editora Globo?
-Em 1936, sob a direção do Érico Veríssimo.
-Monteiro Lobato, quando conheceu seus poemas, encomendou-lhe um livro?
-Isso foi em 1939; escrevi, então, “Espelho Mágico”.
-Como Monteiro Lobato, você também escrevia para crianças?
-Em 1975, foi editado o meu poema infanto-juvenil “Pé de Pilão, uma coedição do Instituto Estadual do Livro com a Editora Garatuja, com introdução do Érico Veríssimo.
-O livro obteve uma ótima repercussão entre a petizada que se iniciava na leitura.
-Os guris gostaram e eu me sentia bem escrevendo para eles.
-Sei que publicou mais cinco obras infantis: “O Batalhão das Letras”, em 1948; “Lili inventa o mundo”, em 1983; “Nariz de Vidro”, em 1984; “O Sapo Amarelo”, em 1984; “Sapato Furado”, em 1994. “Pé de Pilão”, que saiu pela primeira vez pela editora Vozes, era de 1968.
-Não foi Monteiro Lobato que o insuflou a escrever para crianças?
-Não, Monteiro Lobato havia gostado de doze quartetos meus; quando me encomendou uma obra, eu escrevi “Espelho Mágico”. Trata-se de uma coleção de quartetos com um texto de Monteiro Lobato na orelha do livro, quando foi publicado em 1951.
-Aqui, no Rio de Janeiro, nós chamamos de quadrinhas, apesar de os livros escolares trazerem impressos o nome “quartetos”.
-Também penso que quartetos se reportam mais às músicas de Haydn, Mozart, Beethoven, Debussy,
 -Como entramos no universo musical, Mario Quintana, vale lembrar que o maestro Gil de Rocca Sales musicou, em 1993, treze poemas seus para o Recital Canto Coral Quintanares. No ano seguinte, em 1994, o maestro Adroaldo Cauduro também musicou poemas seus para o Coral Casa de Mario Quintana.
-Foi um bálsamo  no fim do meu caminho.

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A visita do poeta Mario Quintana prosseguirá no próximo número, por enquanto, como bônus, reproduziremos o poema com que Manuel Bandeira saudou  o poeta quando ele foi homenageado por seus pares na ocasião dos seus 60 anos de idade.

Meu Quintana, os teus cantares
Não são, Quintana, cantares:
São, Quintana, quintanares.

Quinta-essência de cantares...
Insólitos, singulares...
Cantares? Não! Quintanares!

Quer livres, quer regulares,
Abrem sempre os teus cantares
Como flor de quintanares.

São cantigas sem esgares,
Onde as lágrimas são mares
De amor, os teus quintanares.

São feitos esses cantares
De um tudo-nada: ao falares,
Luzem estrelas luares.

São para dizer em bares
Como em mansões seculares
Quintana, os teus quintanares.

Sim, em bares, onde os pares
Se beijam sem que repares
Que são casais exemplares.

E quer no pudor dos lares,
Quer no horror dos lupanares,
Cheiram sempre os teus cantares.

Ao ar dos melhores ares,
Pois são simples, invulgares,
Quintana os teus quintanares.

Por isso peço não pares,
Quintana, nos teus cantares....
Perdão! Digo quintanares.





quinta-feira, 26 de julho de 2012

2191 - e reuniram-se os deuses nórdicos, desceu o Valhala todo a escrever cartas


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O BISCOITO MOLHADO
Edição 3991                                      Data: 21 de julho de 2012
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CARTAS DOS LEITORES

-Li a edição deste periódico sobre os 77 anos da Brigitte Bardot, quando foram transcritas algumas observações de Cícero sobre a velhice. Ora, ele cultivava a tranquilidade dos filósofos. Eu gostaria de conhecer a avaliação sobre a terceira idade daqueles que viveram paixões efervescentes antes dos cabelos embranquecerem, se é que tinham cabelos. Thor
BM: O leitor conhece o senador Bernardo Cabral que, de acordo com os mexeriqueiros, dançou, quando ministro da Justiça do governo Collor, de rosto colado o bolero Besame Mucho com a ministra da Economia Zélia Cardoso de Mello. O leitor também conhece o economista Roberto Campos, que foi esfaqueado por uma amante, fato que ele omitiu da sua formidável biografia “A Lanterna na Popa”. Conta Bernardo Cabral que conversava com Roberto Campos, quando uma atraente mulher passou pelos dois.
-Estou ficando velho. - lamentou Roberto Campos.
Bernardo Cabral narra que pousou a mão sobre o seu ombro e lhe disse:
-A velhice é o armazenamento da juventude.
Então, segundo Bernardo Cabral, Roberto Campos retrucou:
-A velhice mantém o desejo, mas perde a oportunidade.
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-Não nego que vibrei de contentamento quando li a declaração do Delfim Netto sobre o motivo de ele doar a sua biblioteca de mais de 250 mil livros para a Universidade de São Paulo: “A USP vai ficar, eu não”. Odin
BM: Se eu estou com o controle remoto da televisão no meu poder, zapeando os canais, eu paro sempre que aparecem o Fernando Henrique Cardoso e o Delfim Netto, apesar de um ser a antítese do outro.
Delfim Netto, quando se tornou Ministro da Agricultura do governo João Batista Figueiredo, mostrava um apetite descomunal pelo cargo do Mário Henrique Simonsen, o Ministério do Planejamento (“Meu negócio é número” - bordão do Dr. Sardinha, personagem de Jô Soares/ Max Nunes que retratava o Delfim).
Quando o mundo entrou em crise com o segundo choque do petróleo, Simonsen pensou em preparar o país para o enfrentamento com rigidez das dificuldades, mas foi atropelado pelo discurso desenvolvimentista do Delfim Netto. Simonsen saiu e o Dr. Sardinha, aplaudido pelo empresariado da FIESP, assumiu o seu cargo, O lema era: o Brasil é uma ilha de tranquilidade num mar de tormenta.
“Meu negócio é número...” Metade das importações brasileiras era constituída de petróleo. Os juros da dívida externa brasileira chegaram a 21% com a política de Paul Vocker no FED, durante o governo Reagan.
Delfim Neto, que decretara uma maxidesvalorização do cruzeiro diante do dólar em 1979, decretou outra, de igual valor, em 1981, quebrando inúmeras empresas endividadas na moeda americana. Decretou ele que a correção monetária e a inflação seriam de 40 e 45%, a inflação ultrapassou os 100%. Em 1982, o Brasil quebrou, entrando em moratória.
As grandes cidades foram tomadas pelos camelôs que ainda hoje vicejam, desempregados que procuraram sobreviver na informalidade.
Hoje, eu me impressiono com o malabarismo intelectual do Dr. Sardinha para justificar as medidas que tomou no tempo em que foi o czar da economia brasileira.
Delfim Netto, octogenário, caiu nos braços do Lula, mas a sua inteligência falou mais alto, e agora o critica no terreno econômico; recentemente, enaltece o Itamar Franco. A má vontade com o Fernando Henrique Cardoso é pétrea, afinal foi ele que geriu o Plano Real que limou a hiperinflação que tinha recebido um incentivo e tanto do Czar do tempo do Figueiredo... Delfim Netto não o perdoa por ter desfeito muito das suas lambanças.
Outro dia, ouvi o Fernando Henrique Cardoso referir-se a Delfim Netto, quando citou os grupos de acadêmicos da Universidade de São Paulo.
Não sou tão extremado quanto o Odin. Creio que Delfim Netto se redime de muitos pecados quando se propõe a doar os seus mais de 250 mil livros para quem quer estudar.
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A propósito do BM que tratou da origem dos táxis, Dieckmann escreveu um asterisco que aqui transcrevemos uma parte em forma de carta.
Os riquixás surgiram no Japão por volta de 1868, no início da Restauração Meiji. Eles logo se tornaram um meio de transporte popular, pelo fato de serem mais rápidos que as liteiras utilizadas anteriormente (e o trabalho humano era consideravelmente mais barato do que a utilização de cavalos).
A identidade do inventor (se houve um) permanece incerta. Algumas fontes citam o ferreiro estadunidense Albert Tolman, a quem é atribuída a invenção do riquixá por volta do ano de 1848 em Worcester (Massachusetts) para um missionário. Outros afirmam que Jonathan Scobie (ou W. Goble), um estadunidense missionário para o Japão, inventou riquixás por volta de 1869 para transportar sua esposa inválida pelas estradas de Yokohama.
Outros ainda dizem que o riquixá foi projetado por um pastor evangélico americano em 1888.  Essa hipótese certamente está incorreta, pois um artigo de 1877 de um correspondente do The New York Times declarava que o "jin-riki-sha, ou carruagem de tração humana" estava sendo popularmente utilizado, e tinha sido inventado provavelmente por um americano em 1869 ou 1870.” Dieckmann.
BM:  Meu caro Dieckmann, não quero desconsiderar a sua fonte, mas muitos “inventos”  já existiam na China e foram conhecidos por nós alguns séculos depois, talvez o riquixá seja um deles. Eis o que eu colhi em outra fonte:
“Um meio de transporte  característico da China é o riquixá, riquexó ou rickshaw que é de tração humana, em que uma carroça de duas rodas onde se acomodam uma ou duas pessoas, normalmente usada como “táxi”.
Quanto ao carrinho de mão, não resta dúvida, quase mil anos antes de os europeus o conhecerem já existia na China. Atribui-se ao general Jugo Liang , que viveu na dinastia Han, o invento.
O carrinho de mão chinês era, evidentemente, utilizado nas guerras.
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-Como terminou a expedição de Pedro Álvares Cabral depois de descobrir o Brasil e guerrar em Calecute? Jord
BM: Cabral se aproveitou da rivalidade entre os governantes de Cochim, onde desembarcou em 24 de dezembro de 1500 e Calecute, e fez ótimos negócios. Com as embarcações carregadas de especiarias, rumou de volta para o leste da África, onde um dos navios encalhou num banco de areia.  Como não havia mais espaço para carga em outras embarcações, a nau foi incendiada por ordem de Cabral.
 A frota fez uma parada em Moçambique, para enfrentar dias depois, a passagem pelo Cabo da Boa Esperança. A mais veloz caravela da frota partiu na frente para levar ao rei as alvíssaras da viagem, comandava-o Nicolau Coelho.  Em 22 de maio, em Bezeguiche, que se chamaria Dakar, encontraram-se com a nau de Diogo Dias, desaparecida há um ano, quando houve uma tenebrosa tempestade. Nela se encontravam apenas sete homens esfarrapados, um deles morreu de emoção ao ver os companheiros.
A nau capitânia, que partiu em 9 de março de 1500,  chegou a Portugal em 21 de julho de 1501; Nicolau Coelho desembarcara em 23 de junho desse ano.  Ao todo, dois navios voltaram vazios, cinco estavam plenamente carregados e seis foram perdidos.
Após as especiarias serem vendidas, as receitas cobriram os custos de equipamento e dos navios perdidos. A frota gerou lucros de até 800% para a Coroa Portuguesa.



quarta-feira, 25 de julho de 2012

2190 - o barato do biscoito

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O BISCOITO MOLHADO
Edição 3990                                          Data: 19 de julho de 2012
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OS TAXISTAS E OS  ASSALTANTES

-Está cada vez mais insuportável viajar de metrô. - desabafei no táxi 009, do Gaguinho, ainda com um zumbido nos ouvidos.
-Muito cheio?...
-Não é só isso; falam nos celulares aos berros; expõem a sua privacidade sem a menor cerimônia. Ora, eu não tenho nada com isso, e nem quero ter! Que falem baixo!
-Já notei que você não assiste ao Big Brother Brasil.
Desconheci o seu aparte e prossegui na minha indignação.
-Mesmo quando os passageiros conversam entre si, só se houve bobagem: pagode, baile funk...
-Não tocavam música clássica nas estações do metrô?
-Isso foi anos atrás quando, nos últimos meses, eu só ouvia duas composições: o primeiro movimento da “Sinfonia Titã”, de Gustav Mahler, e “Quadros de Uma Exposição”, de Mussorgsky.  Depois de ouvi-las todos os dias, eu imaginei que roubaram a discoteca do Metrô e só deixaram esses dois discos.
-Uma música que agrade aos nossos ouvidos é, pelo menos, um oásis no meio de tantas besteiras que se falam à nossa volta. - observou.
-Acabo me tornando um daqueles socialistas brasileiros que querem muito bem às pessoas do povo, mas eles aqui, nos trens do metrô e da Central do Brasil, e ele em Paris.
-E o Hugo Chávez que não conseguiu manter o Fernando Lugo, no Paraguai, mas meteu a Venezuela no Mercosul?... Para mim, um sujeito que se aproveita da batina para fazer filho nas carolas é muito safado. - disse ele.
-Eu não discuto isso; eu vejo o problema paraguaio por outro prisma. Existe meio milhão de brasileiros nesse país, chamados de brasiguaios, que cultivam a soja e transformaram o Paraguai no quarto ou quinto exportador mundial dessa mercadoria. O Fernando Lugo, em nome do seu socialismo estrambótico, não mexia uma palha em defesa dos brasiguaios, quando eles eram atacados pelos sem-terra de lá.
-A nossa política externa comeu mosca; aliás, nós sempre seguimos a vontade do Hugo Chávez. - observou.
-Dizem que ele ameaçou cortar a entrega de combustível ao novo governo do Paraguai, mas a Dilma Rousseff reagiu: se ele fizesse isso, o Brasil não deixaria os paraguaios desabastecidos.
-Se for verdade, eu aplaudo a presidente. - declarou.
-Por outro lado, aceitou a Venezuela no lugar do Paraguai, no Mercosul. Mas com esse protecionismo exagerado, principalmente da Argentina, o Mercosul está fadado ao fracasso. - manifestei-me.
-Soube que o dólar subiu alucinadamente na Argentina.
-A Cristina Kirchner afunda cada vez mais o seu país. O protecionismo lá chegou ao ponto de uma empresa, para importar 1 dólar, tem de exportar 1 dólar. Assim, empresas fabricantes de celulares, por exemplo, que necessitam de componentes de fora da Argentina, têm de exportar garrafas vinho. É a economia do uno por uno.
-Espero que o Brasil de amanhã não seja a Argentina de hoje. - disse, enquanto parava o carro na Rua Modigliani.
No dia subsequente, peguei o táxi 045, o do Gordinho.
-Podia aparecer o sol para, pelo menos, esquentar um pouquinho. - comentou.
-Está difícil fazer até a barba.
-Você molha o rosto, não molha? Eu jogo talco e, depois, passo o barbeador elétrico.
-Primeiramente, eu emplastro a barba com creme, mas antes eu pincelo a cara com água fria. Após isso tudo, raspo com uma lâmina inspirada na Gillette.
-A água fria fica distante da minha barba. - afirmou.
-De manhã cedo, eu caminho e como a friagem ajuda, eu acelero bastante as minhas passadas, assim, consigo entrar no chuveiro de água fria; não posso, porém, deixar o intervalo da caminhada para o banho chegar a cinco minutos, senão eu congelo.
-E a temperatura está por volta de 20º. - sorriu.
-Digamos que, na hora das minhas caminhadas, a temperatura esteja por volta de 17º.
-Eu também caminho de manhã, foi exigência do médico para eu emagrecer e controlar a pressão arterial.
-As caminhadas só trazem benefícios. - empolguei-me.
-Também para os assaltantes...
Atingido o objetivo dele de me deixar intrigado, esclareceu:
-Com a chegada do inverno, ainda está escuro às 6h da manhã. Eu caminhava por volta das 5h 30min pela calçada da igreja do bispo Macedo, quando vislumbrei um tipo suspeito um pouco à frente de mim. Estávamos separados por um tapume, pois aquela calçada está em obra.
-Será que virão pedras de Jerusalém? - aparteei.
-Não sei por que eu pisaria a terra, mas resolvi dar meia volta. De esguelha, vi que o sujeito também girou 180 graus. Continuei calmamente sabendo que seria assaltado. Ele então disse: “perdeu”, puxou o meu fone de áudio, plugado no meu radinho sintonizado na Ceci Melo, a locutora de notícias da Rádio CBN. Por instinto de defesa, segurei o fio e ele levou a mão à cintura. “Quer levar um tiro na cara?” Notei que ele olhava por cima da minha cabeça, demonstrando mais medo do que eu.
-Os vigias da igreja ficam por ali e com a escuridão, tornam-se invisíveis.
-Eu seu disso, por isso, eu torci mais do que o assaltante para que nenhum vigia estivesse ali, vendo o assalto, pois eles poderiam atirar e me acertar.
-E o assaltante com medo. - adiantei a narrativa dele.
-Com tanto medo, que não viu o meu relógio de 100 reais e o meu tênis de 200. Levou, apressadamente, o meu radinho e o áudio, que não devem valer 5 reais.
-Não valeria um pouco mais? - pus em dúvida a sua avaliação.
-Para você ter uma ideia, nesse mesmo dia, fui à Casa e Vídeo e comprei o radinho para enganchar no cós da bermuda e o fone de áudio  por 14 reais; o que o meliante levou  estava com o gancho partido e precisando de pilhas novos.
-Tudo por 5 reais.- resumi.
-Se os vigias do bispo Macedo estivessem lá, atirando, eu corria o risco de morrer por 5 reais. Quanto aos assaltantes, a vida deles não valem mais do que isso. - disse, enquanto me deixava na Rua Modigliani.


terça-feira, 24 de julho de 2012

2189 - papoulas ao mar

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O BISCOITO MOLHADO
Edição 3989                                              Data:  19 de julho de 2012
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EU  E  ELIO  NA  FROTA  DO  CABRAL

-Quando eu vi os homens construindo um altar em terra, por ordem de Pedro Álvares Cabral, soube que era dia 26 de abril de 1500.
-Como, Carlos?
-Desde a escola primária me obrigaram a decorar a data da primeira missa no Brasil; a data e o nome de quem a celebrou, Frei Henrique de Coimbra.
-Eu me lembro também disso tudo; até ficou na minha memória o nome do Bispo Pero Fernandes de Sardinha, que foi comido pelos índios caetés.
-Também como esse nome....
 -Será que há canibais aqui, Elio?
-Entre os indígenas, não acredito; alguns são nômades, outros sedentários. Conhecem o fogo, mas não os metais; os homens caçam e pescam, as mulheres se dedicam à agricultura.
-Olha: um grupo oferece vinho aos índios. - apontei.
Aproximamo-nos daquelas pessoas que riam com a reação dos índios, que cuspiam a bebida e faziam caretas de asco.
-Só devem beber água. - entremeou um marujo as suas palavras com risos.
Um índio, que se afastara, retornou com uma espécie de cuia com um líquido dentro. Fez sinal para que um marinheiro bebesse, mas este se mostrou demasiadamente desconfiado.
-É melhor beber, pois são ordens superiores nós não aborrecermos os naturais da terra. - lembrou alguém.
-É cauim. - sussurrei no ouvido do Elio.
-O tal marinheiro bebeu um gole e, em seguida, abanou a boca aberta com a mão espalmada.
-Caramba, isso é fogo líquido. - disse ele.
-Também quero provar. - gritou cada um dos integrantes do alegre grupo, estendendo os braços.
-Os índios brasileiros têm um invejável conhecimento de bebidas alcoólicas fermentadas, que obtêm de raízes, cascas, sementes, frutos, tubérculos, totalizando uns oitenta tipos de aguardente.
-Os americanos usaram o uísque para amolecer a fibra dos índios, os brasileiros não precisaram. - interrompi o Elio.
-Cabral não vai partir logo do Brasil, é melhor, então, nós nos dedicarmos ao trabalho para o tempo passar mais rápido. - propôs.
-Eu vou escrever agora uma edição do Biscoito Molhado sobre a descoberta do Brasil.
-Pero Vaz de Caminha já escreve sobre isso.
-Mas o texto dele é chapa branca e ainda pede emprego para um conhecido.
-Bem, Carlos, Pedro Álvares Cabral ordenou que se armazenasse água, alimentos, madeira e outros suprimentos. Trabalho não faltará para todos.
-E você, Elio, o que fará?
-Vou corrigir os erros de português da Carta de Pero Vaz de Caminha.
Transcorridos dois, três dias, Cabral ordenou que se construísse uma cruz com a madeira vertical ultrapassando os sete metros de altura.
-Terei de assistir a outra missa católica. - resmungou o Elio.
-Calma, Elio, as sinagogas só aparecerão no Brasil e nas Américas com a invasão holandesa.
No dia primeiro de maio, foi celebrada a segunda missa. Em honra a cruz, Cabral chamou o lugar descoberto de Ilha de Vera Cruz.
Um navio da frota partiu na manhã seguinte.
-De quem é aquela embarcação que se vai?- perguntei a um soldado.
-Uns dizem que é a de Gastar de Lemos, outros, a de André Gonçalves. Leva a carta de Pero Vaz de Caminha e avisa ao rei das novas terras de Portugal. - respondeu.
Pouco depois, éramos todos nós que zarpávamos, mas com outro destino: as Índias.
-Em poucos dias, dobraremos o Cabo das Tormentas. - disse-me um tripulante.
-O nome de lá mudou para Cabo da Boa Esperança. - retruquei.
-Boa Esperança... - a sua expressão era tão lúgubre que um arrepio de pavor percorreu-me a espinha.
Em poucas horas, as nuvens se tornaram carregadas e o mar ficava cada vez mais encapelado.
-Elio, a Dona Sarita lhe ensinou o que aconteceu com a expedição de Pedro Álvares Cabral depois da descoberta do Brasil?
-Carlos, se ela tivesse me ensinado, eu não me meteria nesta enrascada, teria embarcado no navio que levou a carta de Caminha. - disse, enquanto as bátegas nos castigavam e o mar se abria com vontade de nos tragar a todos.
-Se eu não soubesse que nasceria 447 anos depois, eu me consideraria hoje um homem morto.
-É o Adamastor de Camões e o Mostrengo de Fernando Pessoa. - reportou-se à poesia.
Passada a tormenta, veio o balanço da desgraça: a caravela de Bartolomeu Dias naufragou, além de três caravelas, perdendo-se quase 400 vidas humanas.  As outras embarcações, com os instrumentos danificados, dispersaram, depois reagruparam-se, porém a que estava sob o comando de Diogo Dias permaneceu distante.
Paramos em Sofala, Moçambique, onde a frota foi reparada e os nervos foram colocados no lugar. Dez dias depois, partimos e desembarcamos em Quiloa.
Enquanto Pedro Álvares Cabral procurava assinar um tratado comercial com o rei do lugar, perguntei ao Elio em que país se situava Quiloa.
-Carlos, no dia da aula de geografia sobre cidades africanas, eu fui visitar o Reinaldo do Jipe na cadeia do Colégio Militar.
 Mais tarde, eu saberia que estávamos em Zanzibar.
Irritado com o rei africano, que se mostrou turrão, Cabral navegou até Melinde, onde Vasco da Grama foi recebido com todas as honras. Lá, repetiu-se a boa recepção e houve troca de presentes.
Antes do desembarque em Calecute, Cabral, repetindo Vasco da Gama, fez uma parada nas Ilhas Angediva para fortalecer máquinas e homens. No nosso destino, Cabral negociou com o Samorim.
-Carlos, parece que tudo corre as mil maravilhas: Cabral obteve autorização para instalar uma feitoria e um armazém.
-Por que, Elio, ele despacha homens para missões militares?
-Tem razão, apesar de o Samorim concordar, é melhor nós nos protegermos em um dos navios.
Foi a nossa salvação; a feitoria foi atacada de surpresa por centenas de árabes muçulmanos e indianos hindus. Os besteiros lusitanos contra-atacaram, porém mais de 50 portugueses morreram, enquanto os demais fugiam para os navios, alguns a nado.
-Cabral está furioso. - gritou um soldado.
-Não interessa aos árabes, que já negociam as especiarias com as Índias, pelo Mar Mediterrâneo, ganhar mais um concorrente, por isso, eles insuflaram este ataque aos portugueses. - deduziu um marinheiro com ares de lobo do mar.
Pedro Álvares Cabral estava, de fato, furioso com o ataque à feitoria; ordenou um devastador ataque a dez navios árabes que estavam ancorados no porto. Depois da morte de centenas de inimigos, foram confiscados os carregamentos dos navios que, em seguida, foram tomados pelo fogo.
-Espero que Cabral já tenha se acalmado depois de tanta fúria.- disse ao Elio.
Qual!... Durante um dia inteiro, bombardeou a cidade de Calecute.
 -Onde nos metemos! - lamentei.
Depois, navegamos até outra cidade da Índia, Cochim, precisamente. Lá, Pedro Álvares Cabral, soube explorar a rivalidade entre as cidades, e assegurou a hegemonia portuguesa na região.
-Carlos, vamos dar um jeito de sair daqui, enquanto as coisas ainda estão calmas.
-Será que há papoulas por aqui?- indaguei.

segunda-feira, 23 de julho de 2012

2188 - escudos para Cabral

O BISCOITO MOLHADO
Edição 3988                                         Data: 18 de julho de 2012
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63ª  VISITA  À  MINHA  CASA

-Pedro Álvares Cabral, você de novo descobrindo o Brasil?!...
-É verdade; depois de 1500 eu nunca mais estive aqui, no Brasil.
-Voltou ao Brasil 512 anos depois.
-As coisas mudaram muito; os habitantes vestem roupas...
-Fala isso porque está em Del Castilho, se estivesse na praia, veria que as coisas não mudaram muito...
-E Porto Seguro?
-Continua com o nome que você deu, mas virou um lugar de turismo com os imóveis supervalorizados.
-E os índios? Não vi um só no caminho para cá.
-Se você chegasse ao Brasil no carnaval, veria alguns.
-Da próxima vez, aprazarei a minha viagem para os dias carnavalescos.
-Pedro Álvares, você pertencia a uma ilustre família lusitana?
-Sim; meu pai, Fernão Cabral, foi 1º regedor das justiças da Beira, adiantado-mor da Beira, coudel-mor do Reino, alcaide-mor de Belmonte, Senhor de juro e herdade de Belmonte, de Azurara da Beira e de Manteigas. Minha mãe, Isabel Gouveia, era filha de João, senhor de Gouveia.
-Você nasceu em 1467, em Belmonte e se chamava Pedro Álvares de Gouveia?
-Só usei o sobrenome de meu pai um ano após a morte do seu primogênito.
-Falam que a família Cabral deriva de um clã castelhano chamado Cabreiras, que as armas de sua família foram elaboradas com duas cabras roxas em um campo de prata?...
-O roxo representa a fidelidade. A minha família já se destacava no século XIV, meu ascendente Álvaro Gil Cabral foi comandante militar de fronteira e permaneceu ligado ao rei D. João I durante a guerra contra o rei de Castela. Como recompensa, D. João I presenteou Álvaro Gil com a propriedade do feudo hereditário de Belmonte.
-Você recebeu, então, uma educação esmerada?
-Fui enviado à corte do rei D. Afonso V em 1479, quando contava 12 anos de idade. Fui educado em humanidades e treinado para pegar em armas e combater. Quando estava com 17 anos, o rei D. João II me nomeou moço fidalgo.
-Era um título que arrancava suspiros das cachopas?
Ele ignorou o tom galhofeiro da pergunta e disse que a nomeação não representava muito, mas tinha a sua importância por vir do rei.
-Adulto, participei de missões no norte da África, lutas contra os muçulmanos, como outros nobres ambiciosos da corte portuguesa.
-Você se dava bem com o rei D. Manuel I, nessa época?
-Dom Manuel, o duque de Beja, ascendeu ao trono em 1495 e me concedeu um subsídio anual de 30 mil reais, em abril de 1497. Com esse valor pecuniário, recebi o título de fidalgo do Conselho do Rei e fui nomeado Cavaleiro da Ordem de Cristo.
-Em 1500, o rei o convocou para chefiar uma expedição à Índia, seguindo o caminho percorrido por Vasco da Gama, que contornava a África?
-Aprendi na escola que a rota pelo Mediterrâneo seria mais curta, mas os turcos tomaram Constantinopla em 1453.
-Portugal e Espanha buscavam uma rota alternativa para chegar à Índia, porque o Mar Mediterrâneo estava sob o controle das repúblicas marítimas italianas e do Império Otomano. Essa dificuldade foi benéfica para nós, pois Portugal se expandiu com a descoberta de novas terras.
-Portugal e Espanha. - acrescentei.
-Sim, difundimos o cristianismo católico em terras pagãs.
-Por isso, o Papa Alexandre VI dividiu as terras a serem descobertas entre portugueses e espanhóis através do Tratado de Tordesilhas.
-Eu estava bem ciente disso. - frisou Pedro Álvares Cabral.
-Não se aborreça, mas tenho de dizer que você não tinha o tirocínio de Vasco da Gama, em matéria de navegação, para levar à frente uma empreitada dessas.
-Era costume a Coroa Portuguesa nomear nobres para comandar expedições navais e militares.
 -E assim as embarcações da sua frota tiveram nobres, no comando, alguns sem experiência e capacidade na arte de navegação.
-Houve líderes competentes, além disso, compuseram a minha missão navegantes com grande conhecimento de arte náutica. Lá estavam Bartolomeu Dias, o primeiro a dobrar o Cabo da Boa Esperança, Diogo Dias e Nicolau Coelho, que, em assuntos de técnicas navais, ajudariam os comandantes militares.
-Entendo.
-No decreto real que me nomeou capitão-mor, os motivos lá estão: meus méritos e meus serviços prestados.
-Não discuto a sua qualidade de chefe militar; a sua missão foi bem sucedida.
-Não foi fácil chefiar 1 500 homens, sendo 700 soldados, com plebeus sem experiência em combates e 13 navios.
-E qual seria a sua recompensa para tamanha responsabilidade?
-Eu tinha direito a 10 mil cruzados, que equivaliam a 35 kgs de ouro e a adquirir 30 toneladas de pimenta, às minhas próprias custas, para transportar de volta à Europa. Eu tinha permissão de vender a pimenta à Coroa Portuguesa, livre de impostos. Autorizaram-me também a importar 10 caixas de qualquer tipo de especiaria, livre de impostos.
-A Coroa Portuguesa foi generosa consigo.
-O rei D. Manuel I sabia que a minha viagem era extremamente perigosa, não se tratava apenas de tomar posse da Ilha de Vera Cruz...
-O Brasil.- interrompi.
-Aquelas terras se encontravam a leste do Tratado de Tordesilhas e, portanto, pertenciam a Portugal.
-Quando você se convenceu que não se apossara de uma ilha?
-Quando retomei a viagem, em 3 de maio, navegando ao sul, constatei que encontrara, na realidade, um continente. Poucos dias depois, veio aquela horrorosa tempestade ao sul da África. Em setembro, a mortandade de Calecute... Fomos atacados à traição pelos muçulmanos.
E concluiu:
-Eu merecia muito mais de Portugal.
-Depois do seu retorno, D. Manuel I planejou outra expedição à Índia para vingar as perdas portuguesas em Calecute e você foi escolhido para comandar a “Frota da Vingança”. Durante oito meses você trabalhou nos preparativos da viagem, mas, perto da partida, em 1502, você foi afastado. Por quê?
-Questões políticas. O comandante passou a ser Vasco da Gama e eu me afastei da corte.
-Mesmo afastado do rei, você se casou, em 1503, com uma mulher de alta estirpe, D. Isabel de Castro, descendente do rei D.Fernando I e sobrinha de Afonso de Albuquerque, grande líder militar lusitano.
-Tivemos quatro filhos.
-Você caiu durante um bom tempo em injusto esquecimento.
-Vivo, ainda me concederam um subsídio mensal de pouco mais de 2500 reais. Sofrendo de febres e tremores de uma malária mal curada, morri em 1520 com pouco mais de 50 anos de idade.
O imperador D. Pedro II lutou pela reabilitação da sua memória e quase houve uma crise diplomática entre Brasil e Portugal por causa do desleixo a que relegaram seu túmulo. A irmã mais velha dele, que reinava em Portugal, Maria II, acertou tudo.
-Sou hoje lembrado?
-A nota de mil cruzeiros novos, que vigorou de 1967 a 1970 trazia a sua efígie e a de 100 escudos, dos anos 30, e as de 1000 escudos, antes da implantação do euro, também traziam a sua efígie.